Materiais locais na arquitetura contemporânea: usando o solo para garantir identidade aos edifícios na Nigéria

Em Lagos, uma cidade de tecido urbano complexo, com edifícios históricos e diversas interpretações da arquitetura contemporânea, está sediado o PatrickWaheed Design Consulting (PWDC). O escritório, coordenado por Adeyemo Shokunbi, procura contribuir para uma nova linguagem arquitetônica nigeriana por meio do renascimento de materiais locais. Seus estudos focam no solo local, composto por laterita, que serve de base para acabamentos e corantes naturais, além de apresentar boas propriedades térmicas. Em dois de seus projetos recentes em Lagos — a Mad House e a Mesquita Abijo — o escritório faz uso dos acabamentos em laterita e defende uma linguagem arquitetônica nigeriana baseada no uso inventivo de materiais locais.

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Mesquita Abijo, Lagos mostrando textura de laterita. Imagem © Adeyemo Shokunbi

Na Nigéria, os acabamentos de parede dos edifícios dependem muito de métodos de suavização manual para obter superfícies lisas. No entanto, esses métodos podem resultar em imperfeições e faces onduladas. Essa foi a principal motivação da PWDC para adotar a técnica de texturização das paredes de seus projetos. "Queríamos esconder as imperfeições nos edifícios. E como fizemos isso? Aplicamos uma textura áspera", diz Shokunbi. "Percebi que ao cobrir essas imperfeições com algo que não é perfeitamente liso, garanto ao edifício um certo nível de credibilidade", acrescenta, destacando a importância da integridade visual que a técnica buscava proporcionar.

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Yoyinsola VGC 2016. Imagem © Tolu Sanusi Rubyspolaroid

No início, a empresa usou a técnica para explorar cores mais escuras que pudessem combater a natureza empoeirada do clima tropical da Nigéria e manter o acabamento do edifício durável. No entanto, de acordo com Shokunbi, isso levou a questões de projeto que desafiaram a estética e a linguagem arquitetônica dos edifícios na Nigéria. "Sinto que chegamos a um estágio em que deveríamos ser capazes de ter uma linguagem, uma linguagem identificável, que seja nossa, com base no que temos localmente, não apenas do ponto de vista material, mas com base em nosso entendimento e também em nossa resposta ao contexto", observa. Ele destaca que outras áreas da cultura nacional, como música, moda e artes, possuem uma linguagem distinta e reconhecível. Isso inpirou o uso da laterita como elemento simbólico de uma identidade arquitetônica local. 

Tudo se resumia a desenvolver a consciência de querer entender como costumávamos construir no passado e como usamos os materiais com os quais costumávamos trabalhar, e também sobre a responsabilidade que temos com nosso ambiente.

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Textura tyroleana laterita. Imagem © Mujib Ojeifo

A laterita é um material argiloso avermelhado que ocorre naturalmente e forma o solo superficial e o subsolo em regiões tropicais. Tem sido amplamente utilizado como material de construção na arquitetura vernacular da África Ocidental, assumindo várias formas, como tijolos de adobe, paredes de taipa tradicionais e técnicas integradas como casas de pau a pique. No projeto Mad House, que envolveu o o empilhamento de contêineres para criar espaços, a equipe da PWDC experimentou o uso da laterita pela primeira vez. Inicialmente, eles a usaram como um simples revestimento em uma parede de bloco, mas descobriram que era caro aplicá-la uniformemente. Eles então mudaram para a técnica tyroleana e substituíram partes da mistura por várias proporções de laterita para explorar suas capacidades de pulverização, aderência, tonalidade e durabilidade. A equipe começou com uma mistura de 1 saco de cimento, 1 parte de areia média e 3 partes de laterita (1:1:3). O cimento foi inflado na proporção para auxiliar na aderência. "Percebemos que, adicionando uma proporção maior de cimento, poderíamos fixar corretamente a laterita. No entanto, a mistura perdia sua tonalidade - você sabe, aquela cor terrosa queimada - e ficava muito pálida", alude Shokunbi.

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Laterite Tyrolean Texture Ratios. Image © Adeyemo Shokunbi

Como resultado, uma mistura de 1/2 saco de cimento, 1/2 parte de areia média e 1,5 partes de laterita (1/2:1/2:1,5) foi explorada para reduzir o teor de cimento. Por fim, uma mistura de 1/4 parte de cimento, 1 parte de areia média e 3 partes de laterita (1/4:1:3) entregou uma boa tonalidade, mantendo as propriedades da laterita. A equipe da PWDC ainda está investigando a proporção da técnica, pois a consistência da tonalidade e aderência depende da origem da laterita. Lateritas de locais diferentes podem se comportar de maneira diferente devido a variações em suas fontes. Isso ampliou o escopo da experimentação e trouxe novos desafios quando a equipe transferiu a técnica para seu próximo projeto, a Mesquita de Abijo em Lagos.

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Mesquita Abijo, Lagos mostrando textura de laterita. Imagem © Tolu Sanusi Rubyspolaroid

Durante a estação chuvosa, a equipe enfrentou desafios com a técnica, pois o acabamento desbotava ou deformava com a chuva. Para resolver isso, o acetato de polivinila (PVA) foi incluído na mistura para ligar, selar e proteger o acabamento contra intempéries. O prédio da mesquita é o epítome da técnica tyroleana de laterita, pois o acabamento envolve completamente o envelope, criando uma linguagem visual única. Shokunbi observa que essa linguagem é inspirada em edifícios de barro tradicionais iorubás e reflete o clima, a cultura e as crenças do povo. O uso de laterita no projeto da mesquita de Abijo teve um impacto significativo além da estética visual. Contribuiu para o desempenho térmico do prédio, proporcionando um ambiente interno fresco e reduzindo o consumo de energia. Com isso em mente, a equipe explorou o uso de laterita nas estruturas de contêineres de seus projetos atuais. Eles usaram técnicas como pau-a-pique para isolar o interior e desenvolveram acabamentos para dar aos contêineres um caráter único. Além disso, eles experimentaram uma "tinta de laterita" misturando o material com PVA e aplicando-o nas superfícies dos contêineres. Isso tornou as superfícies mais receptivas para a técnica tyroleana.

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Técnica de acabamento de bolas de lama com laterite, Mad house, Lagos. Imagem © Oluwadamilola Adams
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Laterite com acabamento tyroleano em faces de contentores, Mad house, Lagos. Imagem © Jide Yeni

O arquiteto nigeriano acredita que existem muitas perspectivas a serem exploradas no uso de laterita e outros materiais locais. "Tudo se resumia a desenvolver a consciência de querer entender como costumávamos construir no passado e como usamos os materiais com os quais costumávamos trabalhar, e também sobre a responsabilidade que temos com nosso ambiente, de tentar reduzir a pegada de carbono", diz ele. Para impulsionar o desenvolvimento de materiais locais, a empresa iniciou um novo braço de pesquisa chamado NANA Collaboratory and Workshop, com NANA representando a Nova Estética Nigeriana Alternativa. Eles pretendem começar com painéis inovadores de laterita e paredes de barro pré-moldado e colaborar com outros arquitetos do país para desenvolver diferentes técnicas. Mais recentemente, em uma colaboração com Tosin Oshinowo, sua equipe no CmDesign Atelier e o Programa das Nações Unidas para o Desenvolvimento (PNUD), a técnica tyroleana da laterita foi empregada em um conjunto habitacional chamado Lares para Ngarannam.

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Laterite com acabamento tyroleano em faces de contentores, Mad house, Lagos. Imagem © Adeyemo Shokunbi

Assim, contribuir para a definição de uma linguagem para a arquitetura nigeriana é um objetivo do escritório. "O que queremos fazer é encontrar maneiras novas e inovadoras de usar materiais de origem local para construir nossa arquitetura", diz Shokunbi. "Como podemos desenvolver essa linguagem em nossa arquitetura? Que princípios podemos extrair de nossa arquitetura tradicional? Como podemos traduzir e incorporar esses princípios em edifícios que construímos dentro dos limites da cidade, que estão ausentes nas áreas rurais? Como fundimos isso? Como encontramos uma sinergia? Essas são as perguntas que precisamos fazer", acrescenta. A exploração da laterita pela equipe do PWDC fornece um modelo para repensar e redefinir o uso de materiais locais, mantendo seus benefícios ambientais com técnicas modernas e criando formas únicas de arquitetura.

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Sobre este autor
Cita: Yakubu, Paul. "Materiais locais na arquitetura contemporânea: usando o solo para garantir identidade aos edifícios na Nigéria" [Exploring Local Material in Contemporary Architecture: PWDC Transforms Building Surfaces in Nigeria] 26 Jul 2023. ArchDaily Brasil. (Trad. Simões, Diogo) Acessado . <https://www.archdaily.com.br/br/1004341/materiais-locais-na-arquitetura-contemporanea-usando-o-solo-para-garantir-identidade-aos-edificios-na-nigeria> ISSN 0719-8906

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